quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Os prepotentes não são tão potentes como acham

Por SÉRGIO ALVARENGA*

O idioma oficial da República Popular do Congo é o francês. Apesar disso, seu time de futebol de maior destaque, a surpresa Mazembe, trouxe relevantes contribuições para o idioma português.

O país está situado no centro da África, mas a vitória do Mazembe trouxe à tona questões sobre a geografia mundial.

Internamente, a República vive uma guerra civil, mas sua equipe de futebol deu lições de democracia.

É sabido que, antes do campeonato de 2000 – vencido pelo Corinthians no maior estádio de futebol do mundo, sem aspas – apenas clubes da América do Sul e da Europa participavam daqueles torneios realizados no Japão ou mesmo daqueles outros, mais antigos, com jogos na Europa e na América do Sul, ordinariamente chamados de “mundiais” – com aspas.

Sempre soube que as palavras têm seus respectivos significados.

Significados que não mudam apenas pela vontade de quem as profere.

Segundo o Houaiss, “mundial” é adjetivo “relativo ao mundo como um todo, à terra inteira; geral, universal”.

Aulete: Ref. ao mundo inteiro, ao planeta”.

Ora, ora.

Já me perguntei antes: que estranho “mundo” – com aspas, claro - era aquele que ignorava, por exemplo, a sua maior potência econômica e bélica, localizada na América do Norte?

Sempre me acometeu a seguinte dúvida: que bizarro “mundo” era aquele que ignorava, por exemplo, o seu país mais populoso, na Ásia?

Sabe aquela guerra entre judeus e muçulmanos? No “mundo” daqueles que acham que havia Campeonato Mundial antes de 2000 não existe. É ficção.

Que delirante “mundo” era aquele que ignorava o chamado continente negro? 

Continente, aliás, do grande time do Mazembe! Continente, aliás, onde foi realizada a última Copa do Mundo. Será que era tudo virtual? Videogame?

Há mais. Que esquisito “mundo” era aquele que ignorava o chamado Novíssimo Continente?

Talvez seja essa a razão pela qual o australiano Julian Assange tem causado tanta celeuma nos últimos dias: é um extraterrestre!

O mais curioso: que excêntrico “mundo” era aquele que ignorava até o próprio país no qual era realizado o torneio?

Ou seja, o campeonato “mundial” era realizado fora do “mundo”!! As equipes viajavam de disco voador?

Entendamos de uma vez por todas: para ser intitulado de mundial, é necessário, ao menos, dar oportunidade para que todos os continentes tenham seus representantes e não sumariamente ignorá-los.

Os prepotentes sempre argumentaram que o futebol fora da América do Sul e da Europa merecia sim ser ignorado.

O argumento é antidemocrático.

O argumento esquece, por exemplo, que a África já ganhou o torneio olímpico em duas oportunidades, infinitas vezes mais do que o Brasil, por exemplo!

O argumento esquece que a Coréia do Sul foi semifinalista em Copa do Mundo.

O argumento esquece que os Estados Unidos foram finalistas da Copa das Confederações, após vencer a poderosa Espanha, atual Campeã Mundial.

O argumento ignora o grande Mazembe.

É, de fato, os prepotentes não são tão potentes como acham…

Cabe perguntar: quem garante que um “Mazembe da época” não poderia ganhar aqueles torneios ditos “mundiais” caso fosse lhe dada uma oportunidade?

Seguramente, ninguém nesse mundo – sem aspas.

Se os prepotentes querem fazer, disputar, comemorar a vitória em um torneio que ignora preconceituosamente vários continentes, que o façam, disputem, comemorem.

Mas, como sempre peço, não o chamem de mundial!

É uma questão de semântica. É uma questão de geografia. É uma questão de democracia.

Campeão Mundial foi o Corinthians.

Que foi vencedor de um torneio do qual participaram representantes da América do Sul, da Concacaf, da Europa, da Ásia, da Oceania.

Foi o primeiro deles. Já que, confirmando tudo que foi dito acima, passou-se a copiar o modelo inicial e, hoje, são organizados, efetivamente, torneios mundiais.

As palavras, insisto, têm seus significados.

E já que o assunto diz respeito a imprecisões da língua, permito-me encerrar com uma redundância: o Corinthians é o primeiro Campeão Mundial de todo o mundo – sem aspas!

*Sérgio Alvarenga é vice-presidente jurídico do Corinthians.

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