quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Eu não disse?

O desvio de dinheiro público na secretaria do Turismo que fiscalização do TCE apurou e que DC e o Estúdio SC (da RBS) noticiaram recentemente, é um desdobramento que não surpreende os leitores deste blog.

A surpresa está em que só agora tenha começado a repercutir na tal “grande mídia”.

Não gosto de me gabar, mas essa história do estranho uso dos fundilhos do LHS/Knaesel, com as suspeitas de irregularidade na distribuição de dinheiro e, principalmente, na prestação de contas, vem sendo tema de posts por aqui há muito tempo. Há anos.

Coloque, por exemplo, ali na caixa de pesquisa, no alto à direita, o nome “kanaesel”. Vai aparecer uma lista de tês páginas (cerca de 49 posts) e a maior parte das notas trata de coisas esquisitas relacionadas ao uso de dinheiro público em 2009 e 2010. Quem tiver tempo e disposição, pode também fazer a mesma coisa no endereço antigo deste blog, para cobrir o período de 2005 a 2008.

E não tem só lama e maledicências, porque também tentei, em alguns momentos, entender seriamente o que eram esses tais fundilhos, que permitem tantas suspeitas de desvio. Olha só o longo texto abaixo, publicado em 2009:

Cursinhos do Tio Cesar

O mecanismo dos Fundos

31 de janeiro de 2009, às 12:41
 
Tive esta semana uma esclarecedora conversa com o diretor de Políticas de Turismo, Cultura e Esporte da Secretaria dessas mesmas áreas (a do Knaesel), Eduardo Macedo.

Procurei-o porque andava muito curioso sobre a quantidade de eventos que pipocam, aqui e ali, sempre com graninhas de algum dos Fundos (Funturismo, Funcultural e Fundesporte).

Bom, é natural que a gente esbarre a cada esquina com algum evento que usa grana pública: atualmente há cerca de sete mil projetos na rua, aprovados nos três fundos da secretaria.

Quem aprova

Os fundos são administrados em parte pelos Conselhos que existem em cada uma das três áreas. Quase todos os projetos (“uns 95%”, segundo Macedo) foram examinados e aprovados pelos conselhos, que são órgãos compostos não só por servidores públicos, mas também por representantes de empresas e entidades afins.

O Conselho Estadual de Turismo é presidido pelo Fernando Marcondes de Mattos (Costão do Santinho) e tem 21 membros, dos quais uns sete ou oito estão ali por escolha do governador (os demais representam entidades que têm assento no conselho). Eles dão a aprovação final para os projetos que deverão receber a grana do Funturismo.

O Conselho Estadual do Desporto é presidido pelo Pedro Lopes, tem 21 membros, dos quais 6 da cota do governador. Aprovam os projetos do Fundesporte.

O Conselho Estadual de Cultura é presidido pelo Péricles Prade, tem 20 membros e 9 indicados pelo LHS. Aprovam, naturalmente, os candidatos ao Funcultural.
 
Claro que há uma equipe técnica da secretaria, que faz a triagem dos processos e checagem da documentação dos candidatos, para que os conselheiros não precisem perder muito tempo.

Como funciona
 
O dinheiro que os fundos distribuem é fruto de renúncia fiscal (e nisso se parecem muito com mecanismos federais como os da Lei Rouanet): as empresas deixam de pagar uma parte do ICMS devido ao governo e destinam esse dinheiro para algum projeto.

Até o final de 2008, os titulares dos projetos aprovados tinham que ir bater à porta das empresas para conseguir, delas, a doação da grana (na verdade, autorização para que o governo repassasse parte do imposto).

Agora em 2009 a coisa mudou: os titulares de projetos aprovados não terão mais que ir atrás da autorização nas empresas. O governo pagará diretamente os projetos aprovados, conforme suas disponibilidades (o Grupo Gestor é que tem a chave do cofre).

Esta nova modalidade tem seus prós e contras, segundo Macedo. A favor está a possibilidade de reverter um quadro distorcido dos incentivos: “as empresas preferem patrocinar festas, eventos e o resultado é que 90% dos projetos que conseguiram captar dinheiro referem-se a esse tipo de atividade”, diz ele.

Isto causa problemas sérios: em Florianópolis, por exemplo, muito mais útil do que dar dinheiro para festas, seria patrocinar projetos de capacitação profissional em turismo, que ajudassem a melhorar o nível dos serviços prestados na cidade. Mas não há projetos, porque não havia dinheiro para isso.

Como é feito o controle?

O governo admite que não tem como fiscalizar, diretamente e durante a execução, todos os milhares de projetos que estão sendo realizados em todo o estado.

Mas, ao final, é preciso prestar contas do uso do dinheiro e se esse uso foi feito de acordo com o que estava previsto no projeto aprovado. Quando há algum indício de irregularidade, é feita uma tomada de contas especial. Muitos projetos estão com suas contas sendo questionadas. Algumas centenas.

A força de um bom QI

O QI, vocês sabem, nada tem a ver com “quociente de inteligência”. Trata-se mesmo do nosso velho conhecido “quem indica”.

Por mais que o Macedo e outros dirigentes da secretaria afirmem que tudo se dá dentro da maior transparência e que os critérios são técnicos, com a decisão soberana de um Conselho plural, quem não nasceu ontem vê que não é muito difícil que alguém, com um bom QI, tenha seu projeto aprovado com maior facilidade que outros.

Isso não é uma coisa ruim em si (afinal, o governo deve ter liberdade de usar nosso dinheiro, dentro de certos limites, pra fazer o que acha que deve), mas torna mais complicada a vida daqueles que deveriam planejar a ação do Estado nas áreas da Cultura, Turismo e Esporte.

Imaginem se o cara, cuidadosamente, planejou algumas prioridades para este ano e no meio do caminho o governador inventa que o legal é organizar um mega-evento internacional de jogo de botão? Pronto, lá se vão alguns milhões de reais para uma atividade que não estava nos planos, mas que fará a alegria de quem teve a idéia e de quem realizará, mediante projetos específicos, esse sonho (ou pesadelo).

Então é isso. Precisa atrair turistas dos Estados Unidos e Portugal, usa o Funturismo para pagar uma empresa de Blumenau que fará isso. Precisa dotar Jurerê Internacional de alguma atração para o verão (afinal, ali quase nada acontece nesta época) usa o Fundesporte para montar uma arena poliesportiva com atrações culturais paralelas. Uma festa no CTG precisa de patrocínio? Usa o Funcultural para ajudar a preservar as tradições. E por aí vai.

Não é o máximo?

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