XICO SÁ
Carta para Lea T.
Cerezo dividiu com todo mundo o carinho pela filha. Deixou claro que não há desgosto |
AMIGO TORCEDOR, amigo secador, esqueça por um momento os canalhas e os faraós que mandam no nosso futiba, esqueça as desgraças recentes do seu time do peito, deixe de lado inclusive os eufóricos triunfos. Ponha uma pedra em cima das resenhas esportivas e amoleça o seu petrificado coração de gelo.
Meu menino, minha menina, que coisa linda a carta que o Toninho Cerezo escreveu para seu filho, sua filha.
Saiu na revista “Lola” deste mês, corra, velho fanático, corra, leia o manifesto do bravo pai do Leandro -o rapaz que virou Lea T.
Cerezo pôs toda a elegância que usava no futebol, talvez o mais conservador e machista dos ecossistemas terrenos, na sua declaração de amor incondicional.
“Dois filhos em um”, o título da missiva, resume com graça a história.
Um chega pra lá, com classe, nos torcedores que o provocaram nos estádios quando Lea T. debutou no mundo fashion.
Cerezo era técnico do Sport no momento em que a modelo, já célebre na Europa, tornou-se conhecida também por aqui.
“A paternidade é livre de qualquer padrão, de qualquer critério imposto pela sociedade, filho deve ser aceito na sua totalidade, na sua integral condição de vida, independentemente da sua orientação sexual”, diz o craque na bola, craque na ética.
Meu menino, minha menina, e não é que a Lea T. repete nas passarelas e editorias de moda a mesma elegância do ex-jogador do Galo e da seleção brasileira?! Tal pai, tal filha, cada um com a sua arte.
E pouco importa que a carta de Toninho Cerezo sirva de exemplo ou não contra o machismo no esporte. Seja no futebol ou no rúgbi. A beleza está no manifesto público de devoção pela sua criatura.
Ninguém é obrigado, em nenhuma circunstância, a demonstrar abertamente o amor ou desamor paterno. Pode-se muito bem resumir o afeto ou o incômodo à convivência, aos muros da privacidade.
Cerezo dividiu com todo mundo o carinho pela filha. Deixou claro que não há desgosto da sua parte. “Menino ou menina, Leandro ou Lea, não importa mais, sempre serei seu pai e você, orgulhosamente, um pedaço de mim”, caprichou na carta aberta.
É para se orgulhar mesmo, moça, seu pai mostrou que é um grande cara. Aproveito a oportunidade para deixar os parabéns. Pelo sucesso e pelo encanto radical que nos desperta. Quanta beleza, quanta ternura.
Um beijo deste mal-diagramado cronista.
(Publicado na “Folha de S.Paulo de sexta).
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